A imagem que abre esta reportagem é do casal Sérgio e Luzia, memória viva da comunidade Tia Eva, durante a missa nas festividades de São Benedito, em 2025, na Capital. (Foto: Paula Maciulevicius/SEC)
Memória, patrimônio e cidadania são pilares que sustentam a identidade de um povo. A primeira guarda vivências e saberes coletivos, o segundo preserva esses traços na forma de monumentos e tradições, e a última é aquela que assegura o direito de cada pessoa se reconhecer nessa história, mais que isso, de pertencer à ela.
Trilhando o caminho dessa correlação que a SEC (Secretaria de Estado da Cidadania) e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), por meio da Superintendência em Mato Grosso do Sul, assinaram nesta quinta-feira (5) um Acordo de Cooperação Técnica que une esforços para fortalecer políticas públicas voltadas à valorização da memória e à promoção da cidadania em Mato Grosso do Sul.
A parceria prevê a realização de eventos, capacitações e projetos conjuntos entre o Iphan/MS e as subsecretarias vinculadas à Cidadania. As ações têm como foco o reconhecimento da diversidade cultural do estado, a preservação de identidades e o estímulo à participação social, promovendo um trabalho intersetorial e educativo.
O documento foi assinado na sede da SEC, em Campo Grande, com a presença da secretária de Estado da Cidadania, Viviane Luiza da Silva, do superintendente do Iphan/MS, João Henrique dos Santos, e de representantes das subsecretarias que integram a estrutura da SEC.
“Quando falamos em cidadania, estamos falando também de pertencimento. E isso só é possível quando a história de um povo é reconhecida e valorizada em sua pluralidade. Este acordo é um marco dentro da gestão pública, como historiadora e antropóloga, sei o quanto é importante construirmos políticas públicas que não sejam passageiras, mas estruturantes. Queremos que o cidadão se reconheça nesse processo e diga: ‘isso aqui é nosso, não pode ser retirado’”, destaca a secretária de Estado da Cidadania, Viviane Luiza.
Em sua fala, Viviane também ressalta o compromisso com a interseccionalidade, reforçando que as políticas de cidadania devem alcançar territórios quilombolas, indígenas, periféricos e também populações LGBT+, que enfrentam múltiplas vulnerabilidades.
“Este acordo com o Iphan fortalece uma política intersetorial e sensível a essas realidades, que antes nem eram discutidas. Hoje, estar aqui, à mesa, celebrando esse compromisso com o Iphan, é algo simbólico — e necessário”, completa.
Para o superintendente do Iphan/MS, o acordo representa um avanço na construção de políticas públicas com foco no cidadão.
“É a primeira vez que o Iphan firma um acordo técnico com uma pasta voltada à cidadania, envolvendo todas as subsecretarias. Estamos estruturando políticas que levem à população o direito à memória, à identidade, ao pertencimento. Não queremos ações pontuais, mas um trabalho contínuo, com impacto real nos territórios”, afirmou João Henrique.
Ele também anunciou a criação de um grupo de trabalho nacional no âmbito do Iphan voltado às políticas públicas para a população LGBTQIAPN+, e destacou o pioneirismo de Mato Grosso do Sul em firmar essa parceria com foco interseccional.
Recortes sociais
Também presente à cerimônia, o subsecretário de Políticas Públicas para Assuntos Comunitários, Jairo Luiz Silva, destacou a importância da parceria para aproximar o Estado das comunidades mais afastadas dos centros urbanos.
“O principal foco do nosso trabalho é fazer com que todos se sintam representados. Atuamos em territórios periféricos, que a cada hora se afastam mais do centro. E esse acordo é uma chance de documentar, catalogar e valorizar o que somos. Estamos muito orgulhosos, porque temos tudo para fazer um belo trabalho e construir uma nova estrutura de reconhecimento e pertencimento.”
Em nome da Subsecretaria de Políticas Públicas para a População LGBTQIA+, a subsecretária em exercício, Tetê Costa, primeira mulher lésbica a assumir o cargo, fez um forte apelo por visibilidade lésbica e o resgate da memória de mulheres que foram fundamentais para o movimento.
“A revolta de Stonewall, marco do movimento LGBT no mundo, começou com a resistência de uma mulher lésbica que foi violentamente agredida e algemada. Ela gritava para as pessoas: ‘Vocês não vão fazer nada?’. E esse grito acendeu a luta. Mas até hoje, o nome dela não é lembrado”, conta Tetê.
A subsecretária em exercício completa contextualizando que no Brasil, o movimento também teve marcos liderados por lésbicas, como no episódio do Ferro’s Bar, no entanto, essas histórias são silenciadas, apagadas. “Dentro do próprio movimento, a lógica patriarcal ainda apaga nossas vozes. Hoje, mesmo que de forma provisória, uma mulher lésbica ocupa essa subsecretaria pela primeira vez. Isso precisa ser dito. Porque nossas meninas não se veem nesses espaços de poder. Precisamos preservar nossa memória, contar nossa história”, enfatiza.
O plano de trabalho da cooperação inclui o apoio a oficinas, seminários, debates temáticos e levantamentos culturais em comunidades atendidas pelas subsecretarias. Além disso, prevê o intercâmbio de informações, o uso compartilhado de materiais e tecnologias, e a valorização das práticas e expressões culturais locais.
A parceria reforça o papel do Estado na promoção de políticas públicas sensíveis à diversidade, voltadas à formação cidadã, à proteção da memória coletiva e à valorização dos territórios culturais de Mato Grosso do Sul.
“A cidadania, como disse o nosso governador recentemente, é a materialização do compromisso de não deixar ninguém para trás. É isso que estamos fazendo aqui, com esse ACT: criando uma política pública de base, construída com seriedade, carinho e participação coletiva”, conclui Viviane Luiza.
Paula Maciulevicius, da Comunicação da Cidadania